Um
pequeno livro da central de propaganda judaica em Portugal
tenta comprovar a "antiguidade da presença dos judeus na
Ibéria" recorrendo para isso à habitual vitimização da
seita. Para tal invoca-se o "Massacre dos Judeus" de
Lisboa a 19 de Abril de 1506. É mais uma mistificação.
Que houve um massacre é indubitável, agora que as vítimas
fossem judeus definidos nos mesmos termos catastróficos dos
contemporâneos é que é algo mais que duvidoso. "Judeus"
foram uma determinada classe social que evoluiu a partir e
dentro da colonização árabe da peninsula ibérica durante 8
séculos. Os judeus ditos "sefarditas" (de
Sefarad, as terras do Ocidente (1) são de
ascendência árabe. Inicialmente o termo referia-se
apenas ao al-Andalus,
a provincia da Bética romana e sul da Hispânia onde os primeiros
árabes que chegaram pelo norte de África a
partir do ano de 711 se
estabeleceram preferencialmente,, ou aos bárbaros das tribos
germânicas invasoras que permaneceram e foram imediatamente
arabizadas ela superioridade da cultura e técnicas
muçulmanas. A extensão da designação
"sefarditas" a toda a peninsula ibérica só
ocorre depois da reconquista
cristã e do Decreto de Expulsão
ou Conversão dos muçulmanos (sob pena de confisco dos bens a
favor de quem os acusasse) após a queda do último reino na
Ibéria, o califado de Granada em 1492.
Em toda a historiografia castelhana o termo para designar as
vítimas da chamada "limpeza
de sangue" para
que pudessem permanecer em terras da cristandade é
a de Mouriscos (2).
Se olharmos para o Édito de Expulsão dos Reis Católicos com
uma lupa não encontramos um
único sinal de "judeus". Os auto-designados "Sefarditas"
eram Árabes, por isso os judeus de
origem Alemã os odeiam, ao melhor estilo racista dos
arianos de ascendência indo-europeia ditos Semitas. Ashkenazis
é o termo num dialecto semitico medieval para as populações
oriundas da Europa Central e Kazaria, usado para designar as
populações estabelecidas na Alemanha (Ashkenaz). Se
expurgarmos da equação histórica as fantasiosas lendas
bíblicas é apenas isto que sobra.Gravura do Largo de São Domingos antes do terramoto
Revisitados
os registos históricos de Lisboa, encontramos vestigios
árabes mudejares e da multiculturidade da cidade por toda a
parte: na toponominia: o bairro da Mouraria,
a rua do Poço dos Negros (onde eram despejados os pretos
mortos), a Calçada do Poço dos Mouros (onde
eram despejados os mouros mortos), o casario de Al-Jama (Alfama)
que cerca a al-Medina (o
castelo), a freguesia de Fátima (do
nome da filha do profeta Maomé (3)
na linguistica: a figura do Alcaide (al-qa-id) o
juiz eleito pela comuna árabe que zela pelo
cumprimento da "Ley dos Mouros" (4), o cargo de Almoxarife dos
direytos dos mouros a quem competia "arrecadar os nossos (do
monarca) impostos sobre os bens dos mouros conversos".
Destas cobradores do Rei se construiu a fama dos inventados
"judeus portugueses" (5). No restante nem
vestigios comprovados da existência de alguma sinagoga de
religião própria nem outros sinais deles... excepto o legado
de transmissão oral de profecias, magias, alquimias e outras
vigarices. Existe contudo o relato do alemão Jerónimo
Munzer (que traz na alcunha pelo
qual era mais conhecido, Hieronymus
Monetarius, o estigma de quem funcionava como banqueiro)
e que entre 1494 e 1495 na viagem que fez por Espanha e
Portugal, descreveu a cidade de Lisboa, falando "na
principal rua de comércio, dizendo que era nela que moravam
os mais ricos, e onde as pessoas são muito educadas. Os
mais ricos, genericamente, são alemães e holandeses. Vivem
na Rua Nova que está construída ao estilo alemão: A maior
parte deles dedica-se ao comércio. Encontram-se aqui judeus
imensamente ricos, quase todos mercadores, e que apenas
vivem do trabalho dos seus escravos”. Em boa verdade é
nesta cena que começa de facto o drama da colonização de
Portugal pelos fundos financeiros Europeus, em concreto por
alemães (logo igualmente por judeus asquenazis, como Jakob
o Rico, fundador da dinastia dos banqueiros da casa Fugger, entre
outros, que haveriam de financiar a chamada "epopeia dos
Descobrimentos (por conta de outrem")
Na
última edição do mesmo "Massacre dos 4000 Judeus"
houve o decoro de retirar da capa os
espirros pintalgados do sangue derramado. Assim sendo a
mistificação ficou um pouco mais asseada. Passe a
mentira da capa, o pior é mesmo o conteúdo.
Os autores citam como fontes uma breve lista que se pode
completar deste modo:1. Um manuscrito redigido por um marinheiro anónimo de origem alemã que se encontrava fundeado no porto de Lisboa e que parece ser o relato mais fidedigno do Massacre ocorrido em Abril de 1506. Nele não se escreve uma única vez a palavra "judeu".
2. Garcia de Resende (1470-1536), que cita na "Miscelânea": "os judeus vi cá tornados/todos num tempo christãos/os Mouros então lançados/ fora do Reyno passados/ e o reyno sem pagãos/ vimos sinagogas mezquitas/ em que sempre erã dictas/ e pregadas heresias". Da expressão "sinagogas mezquitas" se deduz que os locais de culto de árabes e judeus, eram uma e a mesma coisa. No que se refere ao massacre de 1506 note-se que esta obra foi escrita 48 anos depois, no ano de 1544, o que coloca especial ênfase na expressão "os judeus vi cá tornados"... (6)
3. Damião de Góis (1502-1572), na “Crónica do Felicissimo Rei Don Manuel de Góis”, encomendada pelo Cardeal Don Henrique, também patrono-mor da Sancta Inquisição do Reino, impressa em Julho de 1566. No capitulo 102 evoca com minúcia "do alevantamento que se em Lisboa fez contra os Christãos-Novos". Refere 1000 mortos (muito longe dos 4000 da propaganda judaica), mas nem por uma vez a palavra "judeus" é mencionada.
4. Jerónimo Osório, Bispo cristão de Silves (1506-1580), nascido nesse mesmo ano do massacre, teólogo de origem castelhana e amigo de Inácio de Loyola, influenciaria mais tarde D. João III de Portugal a chamar a Companhia de Jesus para Portugal. Fez estudos em Teologia cristã e os seus alegados conhecimentos da "língua hebraica" ter-lhe-iam permitido ler as obras dos Sagrados Padres da Igreja. Em 1537, D. João III nomeou-o professor de Sagrada Escritura na Universidade de Coimbra. É nessa qualidade que faz uma referência ao Massacre de 1506 num escrito datado de 1571, isto é, 65 anos depois do acontecimento.
5. Solomon Ibn Verga, autor do “Shebet Yehuda” (“o Ceptro de Juda”), um dos 12 líderes das tribos israelitas dos 12 filhos da personagem da mitologia bíblica Jacob. “Ibn Verga não assistiu in situ aos acontecimentos do Massacre, recriou a sua narrativa através de testemunhos orais, encontrando-se o texto original escrito em hebraico, publicado postumamente pelo filho Joseph Ibn Verga, conforme citado por Yosef Hayim Yerushalmi, (1932-2009) judeu norte americano, professor na Universidade de Columbia. Trata-se de pura mistificação bíblica contemporânea. (ver nota complementar nº 8)
6. Yosef Ha-Kohen (1496-1575) um estrangeiro nascido em Avignon que viveu em Castela na povoação de Cuenca vindo a falecer em Génova, cuja única afinidade é ter-se servido do livro de Samuel ben Usque “Consolação às Tribulações de Israel” como fonte para a obra de sua autoria “Crónicas dos Reis de França e da Turquia” (1558)
7. Imanuel Aboad (1555-1628) deixou um testemunho “já datado do século XVII e muito ao sabor e tradição do profetismo bíblico (citado a pp 69 da própria obra aqui criticada).
8. Isaac Abranavel, (1437-1508) é uma das testemunhas mais importantes. Infelizmente não residia em Portugal desde à muito. Entrou ao serviço do rei Afonso V de Portugal como tesoureiro e, abusando das suas funções, converteu-se num rico financeiro (obviamente judeu). Abravanel foi obrigado a deixar o seu cargo, tendo sido acusado pelo Rei D. João II (1481-1495) de conivência com o Duque de Bragança, que foi decapitado sob acusação de conspiração. Avisado a tempo, Abravanel salvou-se, fugindo em sobressalto para Castela em 1483, ou seja, 23 anos antes do massacre. Relatos de época referem a figura simplesmente como o "Abarbanel" (daí o léxico popular "abarbatar"). Não voltou. Nem foi minimamente afectado com a "ordem de expulsão" de 1492. Radicado em Toledo começou a servir a casa de Castela, juntamente com o seu amigo e influente Don Abraham Senor, de Segóvia, encarregando-se ambos (7) de administrar as receitas públicas e fornecer abastecimentos ao exército real, com "contratos que executaram com boa competência, para satisfação total de Fernando e Isabel de Castela".
9. Samuel
Usque, Diz a informação difundida pelas fontes judaicas
que Samuel ben Usque (segundo lhe reza o currículo
contemporâneo, “autor de uma obra prima da literatura
portuguesa e sefardita”), provavelmente nasceu em Lisboa no
ano de 1500, "tendo fugido das barbáries da Santa
Inquisição (instaurada em Portugal no ano
de 1536) e indo viver durante algum tempo na
italiana Ferrara", onde 17 anos depois foi publicada a
sua única obra conhecida, a “Consolação às Tribulações de
Israel” (1553), ali feita na casa do impressor Abraão
ben Usque, personagem que usava também o nome de origem
ibérica Duarte Pinal. Nesse mesmo ano de 1553 e na mesma
oficina foi igualmente impressa a "Biblia de Ferrara",
livro em cuja capa se inscrevia: "Biblia en Lengua Española
Traducida Palabra de la Verdad Hebrayca por Muy Excelentes
Letrados, Vista y Examinada por el Oficio de la Inquisicion.
Con Privilegio del Ylustrissimo Señor Duque
de Ferrara"Como se explica que Samuel ben Usque tenha "fugido da bárbara Inquisição cristã" em Portugal indo refugiar-se e trabalhar em perfeita sintonia com a Inquisição italiana decretada pela bula Papal “Pessimum Genus” (8) para todos os reinos europeus? (9)
Notas
(1) Inicialmente Sefarad era Sardis, capital do reino da Lidia no tempo do imperador Dioclesiano, uma das sete igrejas do "Livro do Apocalipse". No seu apogeu foi uma cidade rica por se situar no vale do rio Hermo cujo leito era rico em ouro. A invenção da moeda é atribuida aos Lídios.
(2) "Historia de los Moriscos, Vida Y Tragedia De Una Minoria", Domínguez Ortiz e Bernard Vincent, 1978 e "Deportados en Nombre de Dios", Rafael Carrasco, 2009.
(3) Fátima, de Fatma, também nome de povoação nos arrebaldes de Meca. Ver o livro "Os Mouros Fatímidas e as Aparições de Fátima" de Moisés Espirito Santo, Assirio&Alvim, 2006.
(4) Citado por Maria Filomena Lopes de Barros em "A Comuna Muçulmana de Lisboa, séculos XIV e XV", Biblioteca de Estudos Árabes, edições Hulgin, 1998
(5) À semelhança da popular obra do académico israelita Shlomo Sand "A Invenção do Povo Judeu", na qual se defende que depois da citação dos habitantes da Judeia pelo historiador romano Flavius Josefus no ano 76, não existiu pelos18 séculos seguintes qualquer outra citação historiográfica sobre os Judeus, só vindo estes de novo a ser mencionados no século XIX com o nascimento da ideologia Sionista.
(6) Garcia de Resende teria escrito que o povo amotinado pelos “dous frades domínicos pregadores nos púlpitos e senhores em lugares públicos, citadinos e vilãos, nas praças, atribuindo aos cristãos-novos a responsabilidade da fome, peste ou terramoto que vinham (...) mais de quatro mil matarom”. Mas, este testemunho de Resende na qualidade de poeta da Corte escrito 48 anos depois, não é fiável, quando comparado com a descrição just-in-time de Damião de Góis, que refere cerca de 1000 vítimas de conversos herejes (e não exclusivamente judias)
(7) Existe um descendente contemporâneo desta familia que, na sua famosa diáspora de judeus errantes, foram parar ao Brasil. Trata-se de Senor Abravanel (n 1930), de nome artístico Silvio Santos, um magnata dos Media com um património calculado em 6 mil milhões de reais.
(8) Inocêncio VIII inspirou-se em Tácito para evocar o título: "Pessimum inimicorum genus laudantes", traduzindo: "aqueles que nos louvam e bajulam são os nossos piores inimigos"
(9)
É sabido como se resolvem este tipo de contradições,
usado desde sempre pelos monges copistas da escolástica
medieval: vão-se alterando ou omitindo
subtil e cirurgicamente cópia após cópia certas passagens do
texto. Samuel Usque teria dito que no dia seguinte ao
inicio do massacre dos judeus "El- Rey com diligência veo a
socorro, diz-se por “simpatia maior con os judeos” – mas
quem o diz? O contemporâneo judeu norte americano Yosef
Hayim Yerushalmi na obra escrita em Cincinnati datada de
1976 “The Lisbon Massacre of 1506 and the Royal Image in the
Shebet Yehudah”(10) A edição moderna da "Consolação às Tribulações de Israel" é da Fundação Calouste Gulbenkian, 1989; com coordenação do mesmo Yosef Hayim Yerushalmi, professor de Estudos Judaicos nas Universidades de Colúmbia e Harvard
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